*Por Jorge Moskovitz
Notícias vêm destacando que empresas desenvolvedoras de Inteligência Artificial começaram a oferecer diretamente serviços de consultoria personalizada para implementação de IA. Mas por que essas companhias, que estão entre as mais avançadas em desenvolvimento, resolveram investir justamente em serviços e implementação, áreas que tradicionalmente pertenciam apenas às grandes consultorias tecnológicas?
Essa pergunta abre caminho para reflexões estratégicas: Será que elas estão mudando seu modelo de negócio? Passarão a competir diretamente com as consultorias que apoiam grandes corporações na adoção de tecnologias? Ou estão apenas reconhecendo onde sempre esteve o verdadeiro diferencial competitivo? A resposta é simples: elas entenderam que a IA não é o produto. A execução, sim!
A vantagem nunca esteve no acesso aos modelos de base. Ela sempre residiu na capacidade de integrar, adaptar e operacionalizar esses modelos de maneira realista, contínua e alinhada à estratégia do negócio. É exatamente isso que gera valor no mundo corporativo.
Vivemos uma era em que APIs, Grandes Modelos de Linguagem (Large Language Models – LLMs) e algoritmos se tornaram commodities. Quase todos os negócios têm acesso às mesmas tecnologias, desenvolvidas pelas chamadas big techs. Mas se os modelos estão amplamente disponíveis, por que os resultados ainda são tão desiguais? Isso ocorre porque o diferencial não está na tecnologia em si, mas na forma como ela é aplicada, personalizada, mantida e integrada aos fluxos de trabalho e decisões de negócios. Ou seja, está na execução, e isso é transformador.
Durante muito tempo, o discurso predominante sugeria que bastava adotar uma API de IA generativa para se posicionar na vanguarda da inovação. Mas a realidade é outra. De acordo com relatório da McKinsey, quase 100% das empresas investem em IA, porém, apenas 1% se considera madura em termos de implementação. A dificuldade de integrar IA aos fluxos de trabalho, com uso prático e sustentado pela liderança executiva, está entre os maiores obstáculos.
Empresas nativas de dados sempre entenderam que o desafio nunca foi apenas “comprar uma IA”. O verdadeiro valor nasce quando ela é operacionalizada com dados confiáveis, de forma escalável, ética e integrada aos objetivos de negócio. É por isso que algumas soluções de IA, mesmo sendo plataformas já prontas para uso, vêm acompanhadas de serviços de implementação. Sem dados de qualidade, pipelines bem definidos e governança clara, não há entrega de valor ou transformação.
Implementar IA sem planejamento é como colocar um motor de um carro de Fórmula 1 em um veículo popular sem adaptar o chassi, o câmbio e os freios. E ainda querer que ele corra bem pelas ruas de nossas cidades sem um piloto profissional. Essa mudança de motor traria potência, mas ela não adianta sem a estrutura devida. Para que a IA funcione, ela precisa de pista (estratégia), motoristas (profissionais capacitados), combustível (dados bem gerenciados) e sinalização clara (governança). Só assim é possível cruzar a linha de chegada bem posicionado em um mercado cada vez mais competitivo e veloz.
Estamos assistindo a um reposicionamento inevitável no mercado. Sai de cena a “IA como produto” e entra a “execução orientada por IA como serviço”. Isso exige das organizações uma mudança técnica, cultural e estratégica, pois não se trata apenas de inovar, mas de fazer isso com consistência. Até porque desenvolver uma API é, hoje, uma tarefa simples e barata, mas mantê-la viva dentro de um ecossistema complexo de dados corporativos e garantir que esteja atualizada, segura e governada é um grande desafio.
A IA só gera valor quando construída sobre alicerces fortes de qualidade de dados, orquestração eficiente e controle de custos. Por isso, as empresas devem investir em parcerias com fornecedoras já consolidadas de soluções baseadas em IA que estejam focando em iniciativas de Agentic AI e na integração de diferentes soluções de IA para atender essa premissa. Devem se alinhar com quem está habilitando agentes autônomos capazes de interagir com dados estruturados e não estruturados, APIs e processos corporativos, sempre com supervisão humana e auditabilidade garantidas. E que, acima de tudo, forneçam suporte desde a arquitetura inicial até a sustentação em produção, de forma altamente consultiva.
A Inteligência Artificial que transforma é aquela implementada, integrada e gerida do jeito certo. A pergunta que toda empresa deveria estar se fazendo hoje não é qual modelo de IA deve usar. Na verdade, há várias outras mais importantes no momento: “Estamos comprando uma solução de IA como produto final ou para o início de uma jornada de transformação?”, “Quem estará ao nosso lado quando surgirem obstáculos?”; “Quem vai apontar as falhas nos nossos dados e ajudar a corrigi-las”; “Como manteremos nossas APIs vivas, seguras e adaptadas às mudanças constantes, às regras e às regulamentações do mercado?” e “Como vamos ajustar nossos fluxos de operação à lógica da IA — e não o contrário?”.
Responder e endereçar na prática essas questões é o que separa os projetos que geram retorno real daqueles que se perdem em apresentações bonitas e entregas frustradas. Afinal, a IA não é o produto de uma empresa que busca utilizá-la. Ela é somente mais um meio para levar, elevar e acelerar o real produto no mercado. Sairá na frente quem conseguir implementá-la e executá-la de verdade.
E você, o que está fazendo sobre isso?
*Jorge Moskovitz, Executivo de Contas Enterprise da Qlik
Aviso: A opinião apresentada neste artigo é de responsabilidade de seu autor e não da ABES – Associação Brasileira das Empresas de Software